Essa decisão foi tomada na sequência da dispersão a tiro de uma manifestação de apoiantes do deposto presidente Mohamed Mursi, o que provocou a morte de cerca de 30 pessoas. Os militares dizem que foram obrigados a abrir fogo depois de desconhecidos terem iniciado um assalto ao quartel da Guarda Republicana no Cairo.
Isso aconteceu praticamente poucas horas depois de o aparelho do chefe de Estado interino do Egito ter declarado que nas próximas 24 horas seria anunciado o nome do novo premiê do país. Agora ficou claro que não se conseguirá formar um gabinete durante os próximos dias. O Al Nur é o segundo partido radical islamita mais influente depois do Partido da Liberdade e da Justiça, que foi quem apresentou a candidatura de Mohamed Mursi. Até este momento ele apoiava os militares, mas agora a Irmandade Muçulmana obteve um novo aliado e o Egito deu automaticamente mais um passo a caminho de uma guerra civil.
Foi precisamente contra este tipo de desenvolvimento dos acontecimentos que alertava o presidente russo Vladimir Putin, durante o seu encontro em Astana a 7 de julho com o presidente do Cazaquistão.
"A Síria já está envolvida numa guerra civil. É triste, mas parece que o Egito também para lá caminha. Gostaria que o povo egípcio evitasse uma possível evolução negativa da situação."
Alguns analistas egípcios dizem que a situação ainda pode ser corrigida. Tudo irá depender das ações do próximo presidente, considera o politólogo egípcio Hani Ayyad.
"Se o novo líder atuar de acordo com as exigências populares, e o povo, por seu turno, sentir que as autoridades começaram a respeitar os direitos humanos, a opinião das pessoas e os valores democráticos, ele permanecerá no poder. Está tudo nas mãos do futuro presidente. Nesse contexto, o exemplo de Mohamed Mursi é elucidativo. Nele votaram milhões de pessoas, muitas das quais não apoiavam a ideologia dos Irmãos Muçulmanos. Eles estavam dispostos a esse sacrifício só para que ele cumprisse a vontade popular e acabasse com a tirania."
Outros consideram que o desenvolvimento da situação está a tomar um rumo muito perigoso. Na opinião do politólogo Dr. Abbas Kunfud:
"Existe o perigo de o Egito mergulhar numa anarquia definitiva e a mudança de poder ser realizada, não de acordo com princípios constitucionais, mas como agora – na praça Tahrir. As razões para isso estão na ausência de fato de tradições democráticas no mundo árabe. O Egito ficou num beco político, só que hoje ainda são poucos os que o compreenderam. Também não devemos esquecer uma outra característica específica das democracias árabes – o reforço considerável dos terroristas. Na sua essência, os países da região estão a colher os frutos da democratização artificial que os Estados Unidos foram impondo nos últimos anos."
Entretanto os tumultos já alastraram à zona turística do Egito. Os museus e locais de interesse do Cairo já não estão acessíveis para os turistas. Já começaram os confrontos na estância de Luxor, onde foram queimadas ou assaltadas as casas de 23 cristãos-coptas egípcios. Também estão a ocorrer recontros entre os islamitas e a oposição laica em Hurghada e em Sharm el-Sheikh.
O turismo mal tinha começado a recuperar das consequências da revolução de 2011. As receitas do turismo foram no ano passado de 10,5 biliões de dólares. O rendimento turismo no Egito está ao nível das exportações do petróleo e das taxas cobradas pela utilização do Canal do Suez. A nova espiral da crise ameaça provocar uma nova quebra dessas receitas e o descalabro econômico iminente. O fluxo de turistas se reduziu no primeiro trimestre de 2013 em 17,3% quando comparado com o período homólogo do ano passado.
Entretanto, as agências internacionais de análise financeira avisam que a economia egípcia já está à beira do abismo e não lhe dão mais de meio ano de vida. Até ao fim de 2013, o Egito precisa de 33 biliões de dólares para pagamentos por conta das dívidas interna e externa e as reservas de ouro do país já se reduziram em quase três vezes: de 36 biliões de dólares, no tempo de Hosni Mubarak, para 13,5 biliões de dólares em 2013.
Segundo os analistas do banco de investimentos Merill Lynch, a última esperança é a ajuda de dadores árabes ricos como a Arábia Saudita, o Qatar e os EAU. Mas as monarquias islâmicas radicais só a irão conceder em condições bastante determinadas. Essas condições dificilmente poderão ser cumpridas por um poder laico no Egito.