Apesar das denúncias de formação de cartel em contratos de licitação do sistema metroferroviário de São Paulo, as empresas denunciadas de integrar o esquema continuam participando de licitações e recebendo pelos serviços prestados à Secretaria de Transportes Metropolitanos de São Paulo, ao Metrô e à CPTM.
Segundo números apurados a partir de dados do Sistema de Informações Gerenciais da Execução Orçamentária (Sigeo) do governo do estado, em 2013 foi empenhado R$ 1,1 bilhão e pago às empresas vinculadas ao cartel quase R$ 784 milhões. Entre 2012 e 2013, houve um crescimento de pagamentos a essas empresas de 270%, com números corrigidos pelo IGP-DI até dezembro de 2013. De 2004 a 2013, o desembolso atinge R$ 6,5 bilhões.
Algumas das empresas citadas frequentemente nas denúncias estão entre as contempladas nos contratos e pagamentos. Segundo os dados, a Alstom recebeu, em 2013, R$ 89,5 milhões do total de R$ 783,6 milhões. Já à Siemens, que denunciou o esquema do cartel ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), foram pagos irrisórios R$ 20,24 mil. Também receberam do governo paulista em 2013 a CAF (R$ 322,34 milhões), o Consórcio Iesa-Hyundai Rotem (R$ 112,6 milhões), Tejofran (R$ 29,10 milhões), MPE (R$ 24,15 milhões) e Bombardier (R$ 11,7 milhões), entre outras.
Os dados se referem basicamente a contratos da Secretaria de Transportes Metropolitanos e da CPTM e não incluem os do Metrô. Isso porque, segundo a liderança do PT na Assembleia Legislativa, os contratos do Metrô não são disponíveis. Os valores referentes aos contratos dos 98 trens investigados pelo Ministério Público, por exemplo, só se tornaram públicos após as denúncias. Quatro dos dez contratos firmados para reforma desses 98 trens, das linhas 1 e 3 do Metrô, foram suspensos por 90 dias pelo Ministério Público de São Paulo na última segunda-feira. O MP-SP alega que, neles, “verificou indícios de que eram viciados e de que existia ausência de competitividade”, segundo o promotor Marcelo Milani.
Os valores pagos pelo governo têm picos de aumento. É o caso do biênio 2009 e 2010, quando os pagamentos saltaram de R$ 891 milhões para R$ 1,6 bilhão, com aumento de 79,1% em 2010. De 2012, quando os pagamentos foram de apenas R$ 211,3 milhões, para 2013, ano em que atingiram R$ 783,6 milhões, o percentual cresceu 270%.
A posição do governo estadual é de que, do ponto de vista jurídico, não há como impedir que qualquer empresa participe de uma licitação sem uma decisão expressa da Justiça que inviabilize sua presença numa concorrência ou a impeça a assinatura do contrato. Em depoimento no dia 24 de setembro na Assembleia Legislativa, por exemplo, o secretário estadual de Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, questionado sobre contratos em vigor que incluem empresas do cartel, afirmou que “elas só poderão ser cortadas depois de trânsito em julgado [de processos judiciais]. Não é simples rescindir contratos”.
Na ocasião, o secretário afirmou também que a formação de um cartel de caráter internacional, como o que opera em São Paulo, inibe a apuração dos fatos e as empresas envolvidas poderiam eventualmente cumprir acordos obscuros, entre si, em outras cidades do mundo. "Imagine esses tentáculos em 15 países. Eles podem fazer uma concorrência aqui e ganhar na 'Cochinchina', a partição pode se dar em países diferentes e até setores diferentes, já que as empresas atuam em áreas como energia e equipamentos de saúde", declarou à época.
Duas semanas antes, o presidente da CPTM, Mário Manuel Seabra Rodrigues Bandeira, havia dado no parlamento estadual declarações no mesmo sentido. "As denúncias e o acordo de leniência não impedem as empresas de participar de novas licitações. Se impedirmos, eles iriam à justiça e conseguiriam o direito de participar", disse. Segundo a assessoria de Comunicação da Secretaria de Transportes Metropolitanos, essa continua sendo a posição do governo.
Segundo o governo estadual, a atuação das empresas acusadas de formação de cartel não se restringe ao estado de São Paulo, mas se estende pelo país, inclusive com contratos celebrados pelo governo federal, que pagou à Alstom, em 2013, R$ 65,3 milhões, de acordo com o Portal da Transparência.
Para o deputado estadual Alencar Santana Braga (PT), presidente da Comissão de Infraestrutura da Assembleia Paulista, a questão extrapola os aspectos jurídicos. “Se do ponto de vista jurídico não tem nenhuma punição ainda, de fato as empresas poderiam estar participando de processo licitatório e ganhar. Mas o problema não é só jurídico, é do ponto de vista político e moral. Porque o que está sob suspeita é a existência de um cartel com a conivência, participação e pagamento de propina, no estado de São Paulo”, diz Santana.
O parlamentar, assim como sua bancada faz desde o ano passado, defende que “as autoridades políticas [à frente das secretarias envolvidas em denúncias] têm de ser afastadas de suas funções”. Ele cita o secretário Jurandir Fernandes e o presidente da CPTM.
Por meio de sua assessoria de Comunicação, a Alstom afirma que “está atualmente enfrentando acusações no Brasil relativas à não-conformidade com leis e regras de competição, que são referentes a temas do começo dos anos 2000 ou anteriores”. “A Alstom gostaria de ressaltar que a empresa tem implementado, em toda a sua organização, regras estritas de conformidade e ética que devem ser aderidas por todos os funcionários”. Leia matéria completa no portal Rede Brasil Atual. por Eduardo Maretti, da RBA
Créditos: Rede Brasil Atual
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