Apesar de ser pintada como a “candidata dos insatisfeitos”, a ambientalista é de longe a postulante mais distante de boa parte dos temas tratados nas manifestações de junho
O PSB (Partido Socialista Brasileiro) deve oficializar o nome de Marina Silva como candidata à presidência da República nesta quarta-feira (20). Porém, seu nome já é fato e os setores mais conservadores da sociedade brasileira, que pregam o discurso do voto anti-PT, vitaminam a candidatura da ex-verde pois, como mostra o DataFolha de hoje, é a única com força de levar o embate eleitoral para o segundo turno. Porém, Silva é mais incógnita do que certezas.
A candidata dos insatisfeitos?
Além de ter o seu nome ligado às questões ambientais, outro discurso que se articula em torno da figura de Marina Silva é o de que ela seria a representação dos “insatisfeitos”, neste caso, dos milhões que foram às ruas do Brasil exigir melhorias nos serviços públicos brasileiros. Se tratarmos a candidata no que diz respeito a um Estado mais presente, esta tese está certa, porém, muitos outros temas estiveram presentes, tais como desmilitarização da polícia, descriminalização e regulamentação do aborto, legalização e regulamentação da venda e consumo da maconha, democratização dos meios de comunicação, transporte público de qualidade com acesso gratuito, criminalização da homofobia e, por fim, a efetivação do Estado Laico.
E não devemos esquecer que, antes da Marina Silva pessoa, existe uma legenda chamada PSB que fez uma série de alianças ao redor do Brasil que inviabiliza a possibilidade de qualquer debate citado acima. Pouco antes de sua morte, Eduardo Campos aventou a pauta da tarifa zero nacional aos estudantes, será que este ponto vai continuar na pauta? Em relação a temas como aborto e drogas, Marina não precisa se preocupar, pois tanto Dilma Rousseff (PT) quanto Aécio Neves (PSDB) já deram declarações de que não vão alterar a atual legislação.
Mas se até aqui os principais candidatos à presidência da República, com algumas diferentes nuances em política externa, pareciam fazer o mesmo discurso, com a entrada de Marina Silva no embate eleitoral as questões sociais e principalmente ligadas ao Estado Laico e sexualidade podem voltar à tona, até mesmo para revelar o campo em que se encontra a candidata do PSB, que em termos religiosos é tão praticante e conservadora quanto o Pastor Everaldo (PSC).
A Bíblia ou a Constituição?
Portanto, Dilma e Aécio devem questionar Marina Silva: vai legislar baseada nos valores do livro “sagrado” ou segundo a Constituição? Se projetos de lei que visem à regulamentação do casamento igualitário chegarem à sua mesa, caso seja eleita, o que vai contar: os valores religiosos em torno da relação entre iguais ou o que prega a Constituição, de que todos são iguais perante a lei?Vale lembrar que a relação de Marina Silva não é nada amistosa com o movimento LGBT, visto que em maio de 2013 ela saiu em defesa do deputado Federal Marco Feliciano (PSC-SP), que à época defendia a “cura gay” e presidia a Comissão de Direitos Humanos (CDH) e declarou que o parlamentar era “perseguido por ser evangélico”. Marina Silva é a favor da “cura gay”?
Ainda nas questões LGBT, Marina Silva já declarou inúmeras vezes que o casamento é “um ato sagrado entre um homem e uma mulher”. Presidenta da República, ela sancionaria um PL que derrubasse a norma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que permite as uniões civis igualitárias sem necessidade de união estável? Ou seja, nesta seara, Silva é puro obscurantismo… E vejam, até o candidato tucano é mais progressista e já declarou que o casamento igualitário é um tema inserido na sociedade e que é a favor, e o governo Rousseff implantou uma série de políticas públicas a partir da Coordenação Nacional LGBT.
Por fim, temos como questão o Estado Laico. Até este momento, as candidaturas do PT e do PSDB vinham flertando com os alguns setores evangélicos que agora, na falta de um, terão dois candidatos que possam representá-los. Posto assim, parte dos votos religiosos têm tudo para se dividir entre Marina Silva e Pastor Everaldo. Eis a grande chance de Dilma Rousseff e Aécio Neves se pautarem na questão do Estado Laico e darem um passo à frente neste tema, principal empecilho ideológico na figura de Marina Silva.
Como se vê, nem de longe Marina Silva representa uma terceira via ou a “voz dos insatisfeitos”, muito pelo contrário, a candidata do PSB transita fortemente no espectro político da direita religiosa. Porém, a imprensa tradicional faz questão de alimentar o voto despolitizado e retratar a candidata como um “gás novo” na disputa presidencial, sem se dar conta de que, numa eventual vitória de Silva em seu discurso de posse, ao lado da Constituição teremos outro livro deitado. Resta saber com qual cartilha um eventual governo Marina Silva será pautado: a Bíblia ou a Constituição. Por Marcelo Hailer. Foto: OutrasPalavras.
Créditos: Revista Forum
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