domingo, 5 de fevereiro de 2017

Delação da Odebrecht nos EUA sacode a América Latina

Odebrecht
Se prometem estragos no Brasil, as delações da Odebrecht já semeiam confusão na América Latina. O motivo é o acordo selado pela empresa no fim do ano passado nos Estados Unidos. Uma história com um mistério sobre confidencialidade. 
Na delação firmada pela empreiteira com a força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba em 1o de dezembro, a cláusula 19 impunha aos investigadores seis meses de sigilo antes da divulgação de fatos a envolver agentes públicos estrangeiros. 
Ao anunciar uma leniência com a construtora vinte dias depois, o Departamento de Justiça do Tio Sam, equivalente ao nosso Ministério da Justiça, divulgou documentos que mencionam 12 nações (Brasil incluído), das quais dez latino-americanas, onde a Odebrecht teria pago propinas. 
Por que nos EUA a delação revelou outros países, se aqui havia a cláusula de segredo temporário? Há quem creia ter faltado valentia ao Ministério Público brasileiro, participante das negociações em Washington, para defender por lá a carência de seis meses. 
A menção pública aos países bagunçou politicamente vários deles, alguns de forma delicada. Muitos têm despachado autoridades para Washington a fim de estabelecer acordos de cooperação que municiem processos locais contra a empreiteira e agentes públicos acusados de corrupção.
O Equador está no meio de uma eleição presidencial, marcada para o dia 19, e os inimigos do presidente progressista Rafael Correa exploram o assunto contra o candidato oficial, Lenin Moreno, líder nas pesquisas. Conforme a papelada norte-americana, a Odebrecht distribuiu 33 milhões de dólares em propina a servidores equatorianos entre 2007 e 2016, período de Correa no poder.
O oposicionista Guillermo Lasso, vice-líder nas pesquisas, cobra do presidente o nome dos subornados, enquanto Correa reclama de a apuração mirar apenas seu governo, embora a Odebrecht faça negócios há muito tempo no Equador. Curiosidade: o mandatário é da opinião de que os EUA são o único país onde não há golpe de Estado por falta de uma embaixada norte-americana por lá. 
A Colômbia prendeu um ex-senador, Otto Bula, e um ex-vice-ministro dos Transportes, Gabriel Garcia Morales, ambos atuantes na gestão do ultradireitista Álvaro Uribe (2002-2010), hoje inimigo de seu sucessor, Juan Manuel Santos, antes um aliado. Bula teria recebido 4,5 milhões de dólares em suborno da Odebrecht e Morales, 6,5 milhões, recompensas para facilitar a vida da empreiteira em uma obra rodoviária. 
Panamá e Peru resolveram banir a construtora de suas fronteiras. No primeiro, pátria da conta usada pela Odebrecht para corromper no exterior, a revelação colocou na mira do MP o ex-presidente Ricardo Martinelli (2009-2014), dois filhos (Ricardo Alberto e Luis Enrique) e um irmão (Mario). 
No Peru, o presidente conservador Pedro Pablo Kuczynski desfez um contrato de 7 bilhões de dólares de uma obra de um gasoduto tocada pela Odebrecht em sociedade com duas empresas. Decidiu relicitar o projeto.  Os rolos da Odebrecht no Peru despertam tanto naquele país, e não é de hoje, que lá foi criado um consórcio jornalístico, o IDL Reporteros, dedicado a investigar conexões peruanas da Lava Jato. 
Na Guatemala, onde teriam sido pagas propinas de 18 milhões de dólares entre 2013 e 2015, o Ministério Público investiga a ex-vice-presidente Roxana Baldetti, primeira mulher a ocupar o cargo no país, e um senador, Felix Bautista. Baldetti foi vice-presidente de 2012 a 2015 e desligou-se exatamente em razão de denúncias de corrupção.
Na Argentina, teriam sido pagos, segundo o material divulgado nos EUA, 35 milhões de dólares em propinas a servidores entre 2007 e 2014. A propósito: o presidente argentino, Mauricio Macri, fará uma visita oficial a Brasília na terça-feira dia 7. 
Os outros três países latino-americanos implicados pela delação da Odebrecht nos EUA são México (propinas de 10,5 milhões de dólares entre 2010 e 2014), Venezuela (98 milhões, de 2006 a 2015) e República Dominicana (92 milhões, de 2001 a 2014).
São citadas ainda duas nações africanas, Angola e Moçambique. Um terço da receita da holding Odebrecht, não apenas seu ramo empreiteiro, nasce de obras no estrangeiro. As retaliações sofridas no exterior não estavam nos cálculos da empresa, quando decidiu fazer uma colaboração premiada. Por André Barrocal / Foto: Yasuyoshi Chiba / AFP
Créditos: Carta Capital

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