Para cientista político, financiamento de campanhas pela iniciativa privada tem levado a vitórias para setores tão diversos como agropecuária e indústrias bélica e de bebidas alcóolicas.
O cientista político Alexandre Ramalho, da Universidade de Brasília (UnB), considera que relações entre empresas financiadoras de campanha e matérias legislativas de seu interesse já viraram rotina. Ramalho citou como exemplos a batalha das instituições financeiras e o cerco firmado por tais entidades aos parlamentares, em 2007, durante a votação que extinguiu a Contribuição Provisória por Movimentação Financeira (CPMF) – por considerarem uma contribuição prejudicial e incômoda aos bancos.
Outros exemplos clássicos apontados por ele são os lobbies observados pelas indústrias das armas, em projetos que tramitam na Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados; pelas empresas que atuam no ramo de agrotóxicos – cujo foco principal são as votações da Comissão de Agricultura da Câmara e de Meio Ambiente do Senado; e, ainda, nas indústrias de cigarros e bebidas alcoólicas.
Na opinião do deputado Henrique Fontana (PT-RS) – que coordenou grupo de trabalho responsável pela elaboração de um projeto de reforma política nunca votado na Câmara dos Deputados –, argumentos constantemente apresentados de que o país deveria se preocupar com mais verba para educação e saúde do que com financiamento público das eleições são ingênuos. Ou mal-intencionados – quando utilizados pelos parlamentares que não querem acabar com as regras em vigor por mero interesse.
“Essas pessoas dizem que a população não tem que pagar pelas campanhas, mas os brasileiros já pagam e fazem isso integralmente, por meio das empresas. Os bancos, por exemplo, retiram dos serviços cobrados aos clientes e em altas taxas de juros dinheiro que vai para as doações de campanha. O valor sai sempre do bolso do cidadão”, enfatizou.
Segundo Fontana, o exemplo mais concreto disso é o fato de que, no ano passado, das 513 campanhas consideradas mais caras no país, 369 foram de candidatos que se elegeram.
No caso da indústria de armas, o seu principal interlocutor, embora fora da Congresso, continua atuando nos corredores e gabinetes junto aos colegas. Trata-se do ex-deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF), condenado recentemente a prisão em regime aberto e ao pagamento de multa por porte ilegal de armas. Coronel aposentado da Polícia Militar do Distrito Federal, o ex-parlamentar é considerado um dos principais representantes da indústria bélica na Câmara e no Senado e nunca negou que são empresas patrocinadoras de suas campanhas – o que defende como “gesto legítimo”.
Durante o plebiscito realizado em 2005 para decidir se a população deveria aceitar ou não o desarmamento, Fraga foi o primeiro deputado que assumiu sua posição como representante das indústrias de armas e, também, o fato de ter suas campanhas financiadas por tais empresas. Ele costuma destacar, quando fala sobre o assunto, que a questão dos armamentos, no Brasil, “passa pelo Estado”. Seu argumento é de que “o Estado que não protege a população também não tem o direito de deixar os cidadãos abandonados, sem terem direito a usar uma arma” – ignorando as estatísticas que, mais que a defesa pessoal, ocorrências geradas por conflitos banais, em âmbito domestico, e até mesmo acidentais têm por trás a existência de uma arma.
No tocante aos agrotóxicos, o ex-gerente de toxicologia da Anvisa, Cláudio Meirelles – exonerado do cargo no final do ano passado depois de ter denunciado um esquema de corrupção para aprovar, de forma mais célere, princípios ativos destes produtos – também criticou a pressão sofrida no Executivo por parte dos deputados e senadores.
“O lobby dos agrotóxicos é impressionante. As estratégias passam tanto pela desqualificação do nosso trabalho, como pela pressão política. Muitos deputados e senadores, como têm campanhas financiadas por esse segmento, estão todos os dias na Anvisa questionando o trabalho dos técnicos, procurando saber porque determinado produto foi proibido. Eles (deputados e senadores) nos procuram para falar sobre os assuntos abertamente e argumentam que atrasos prejudicam a produção. Mas nossa preocupação sempre foi com a segurança desses produtos e não com a produção agrícola que utiliza tais agrotóxicos”, enfatizou.
O deputado Moreira Mendes (PPS-RO), que é presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, evitou falar sobre a relação entre o financiamento direto dessas empresas às campanhas dos parlamentares, mas não negou a ligação entre os integrantes da frente e tal segmento (fabricantes de agrotóxicos). “Temos força e objetivos para enfrentar as discussões sobre os temas e convicção em tudo o que defendemos”, reiterou.
Os exemplos desse fino relacionamento não param por aí. O deputado Júlio Campos (DEM-MT), que defende o financiamento privado de campanhas, admitindo um modelo de financiamento misto como melhor opção, destacou que depois de quatro mandatos não tentará nova candidatura em 2014. Com 16 aos de atuação parlamentar, Campos afirmou que não tem mais condições de competir com os colegas para conseguir patrocínio suficiente, por parte das empresas, para bancar os custos de uma campanha. Sem falar que os valores tendem a ser cada vez mais altos, a cada pleito.
“Não há como, num país como o Brasil, da forma como as coisas têm acontecido, não haver financiamento de campanha pela iniciativa privada. Basta dar uma olhada no plenário da Câmara. São vários os segmentos representados pelos parlamentares presentes”, ressaltou, apontando para os colegas.
“O que eu defendo é que o financiamento seja privado sim, mas com mais transparência e prestação de contas imediata. Infelizmente, o fim do financiamento privado total, como desejam o PT e vários outros partidos, não passa nessa Casa de jeito nenhum”, colocou.
De acordo com Júlio Campos, existem no Congresso o que ele definiu como quatro tipos de parlamentares: “Os independentes (grupo do qual se considera parte); os vinculados ao atual governo ou às entidades sindicais; uma facção formada pelos que por si só já representam o empresariado porque são, eles próprios, empresários; e os que são bancados pelas empresas privadas e defendem os interesses dessas empresas. Não há meio termo”, acentuou.
CRÉDITOS: Rede Brasil Atual
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