Até 2003, a rede federal de ensino superior tinha ao todo apenas 45 universidades, que somavam 148 campi espalhados pelas capitais e grandes centros urbanos brasileiros – unidades essas voltadas ao ensino, a pesquisa e a produção de conhecimento, sem os quais um país não se desenvolve economicamente, e tampouco reduz as desigualdades regionais .
Naquele ano foi criado o Programa Expansão, para atender às metas do Plano Nacional de Educação (PNE) quanto à ampliação da rede e do acesso ao ensino superior, para a formação de recursos humanos para pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico. Pela primeira vez, novas universidades ou extensões das já existentes passaram a ser construídas no interior do país – chegando até a alguns rincões distantes – aproximando-se das necessidades e das potencialidades regionais.
Segundo o Ministério da Educação (MEC), até 2014 foram criadas 18 novas universidades federais e 321 campi em todas as regiões. Nos cursos presenciais de graduação, o número de vagas passou de 113.263, em 2002, para 245.983 em 2014. E o número de cursos aumentou no período, de 2.047 para 4.867.
Nem tudo foi perfeito nesse processo de ampliação ainda em curso em muitas universidades. Os desafios incluíam falta de professores e demais servidores, e problemas na infraestrutra em construção mostravam as dificuldades comparadas às de trocar um pneu com o carro em movimento.
Mesmo assim, com a ampliação física da rede articulada com um sistema de ingresso mais democrático e a adoção de cotas, as universidades federais passaram a ter entre seus alunos os filhos da classe trabalhadora, indígenas e até quilombolas, historicamente excluídos.
Prestes a completar 10 anos – a mais jovem das novas instituições – a UFABC se destaca em diversos rankings de excelência no ensino e é a única no país a ter 100% dos professores com doutorado. Usando notas do Enem como sistema de seleção desde que foi criada e com adoção do sistema de cotas, foi avaliada pelo índice geral de cursos do MEC como a melhor universidade no estado de São Paulo e primeira no ranking de cursos de graduação entre todas as universidades do país.
"Isso comprova que a inclusão de alunos, a maioria de baixa renda, vindos da escola pública, não atrapalha os resultados da universidade, como muitos apontam", diz o reitor da UFABC, Klaus Capelle. "É isso tudo que está em risco com os cortes", completa, referindo-se às diretrizes para a educação superior já apontadas pelo governo interino de Michel Temer, baseado exclusivamente numa suposta "austeridade" na aplicação de recursos públicos.
No entanto, a democratização do acesso requer ações para garantir a permanência desses estudantes na escola. A maioria deles necessita de auxílio para moradia, transporte e alimentação. Custeios que se somam ao restante necessário para fazer a universidade funcionar. A situação, que já vinha difícil e se agravou com o ajuste fiscal da presidenta afastada Dilma Rousseff, tende a se tornar insustentável.
Há duas semanas, o governo interino de Michel Temer anunciou cortar até 45% dos recursos previstos para investimentos no próximo ano em comparação com o orçamento de 2016. As verbas para custeio devem cair 20%. É algo como R$ 350 milhões a menos a serem investidos. O percentual será incorporado ao Projeto de Lei do Orçamento Anual (Ploa), que o Executivo deve enviar ao Congresso até o final do mês.
"Se os parâmetros de corte continuarem, a universidade estará inviabilizada. Temos de ir aos ministérios, ao Parlamento, para reverter esse cenário", defende a reitora da Unifesp, Soraya Smailli. Como exemplo, ela relata que há obras paralisadas na ampliação de ambulatórios do Hospital São Paulo, vinculado à universidade, que atende à população da capital e de diversas cidades do interior.
"Se a atual situação perdurar, em dois anos vamos ter de cortar vagas", diz Eduardo Antonio Módena, reitor do Instituto Federal de São Paulo. De acordo com ele, mais da metade dos alunos são cotistas e dependem de assistência estudantil. "Vai aumentar a evasão, porque essa assistência é fundamental."
A asfixia da rede federal em curso por Temer é acompanhada de outros ataques aos estudantes de graduação – por exemplo, as parcerias com universidades privadas. Embora contrariem a posição defendida por alguns especialistas, professores e militantes, que querem ensino superior público, gratuito e de qualidade para todos, mas com verbas públicas apenas para as entidades estatais do setor, tais parcerias são uma alternativa que colocaram na faculdade filhos de trabalhadores e demais classes populares, que não poderiam estudar sem as bolsas.
Em 23 de maio, porém, o presidente interino e seu ministro da Educação, Mendonça Filho, anunciaram a suspensão de novas vagas para o programa de financiamento estudantil (Fies), o programa Universidade para Todos (ProUni) e o programa nacional de acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). Em 25 de julho, a dupla anunciou alterações no Ciência sem Fronteiras. Um golpe fatal no espírito do programa, o de proporcionar intercâmbio em universidades estrangeiras para estudantes da graduação. Sem contar as bolsas para pesquisa na pós-graduação, que também sofreram cortes.
Em junho, afirmando com pompa que educação é prioridade, Temer anunciou a abertura de 75 mil vagas no Fies, aquém do programado pelo governo de Dilma Rousseff, conforme seu ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que afirma que o governo golpista promoveu um corte de 95 mil vagas previstas para este ano.
Além do ensino superior – que é obrigação constitucional da União – Temer avança sobre a educação básica, que inclui o ensino fundamental e médio. No dia 2 de junho, o ministro Mendonça Filho publicou a exoneração de 31 assessores técnicos do ministério, sendo 23 ligados à Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi) e oito, à Secretaria Executiva da pasta. Por Cida de Oliveira, da RBA. Foto:AC
Créditos: Rede Brasil Atual
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