A Polícia Federal receberá, nas próximas horas, uma denúncia quanto à possível prática de ato condenável por parte do Instituto Datafolha, de propriedade do diário conservador paulistano Folha de S. Paulo. O veículo, declaradamente favorável à candidatura do tucano José Serra, divulgou nesta quinta-feira que o representante do PSDB na corrida à prefeitura de São Paulo ocupa agora o segundo lugar isolado, com 21% das intenções de voto, com 6 pontos de vantagem sobre o terceiro colocado Fernando Haddad (PT). Celso Russomanno (PRB) teria mantido a liderança na disputa, agora com 14 pontos de frente. Em pesquisa semelhante, no mesmo período, o Instituto Vox Populi, também especializado no setor, aponta continuidade tanto da subida do candidato do PT (18%) quanto da queda do candidato do PSDB (17%).
Serra, segundo o Datafolha, que oscilou um ponto para cima em relação à pesquisa anterior, realizada em 10 e 11 de setembro, beneficiou-se da variação de Haddad de 17% para 15%. Na sondagem anterior, realizada entre os dias 11 e 12 de setembro, ambos estavam em empate técnico, com 20 e 17 por cento, respectivamente, dentro da margem de erro de três pontos. A margem de erro da pesquisa realizada esta semana é de dois pontos para mais ou para menos, o que teria feito com que Serra despontasse à frente de Haddad na disputa pela segunda posição.
Russomanno teria crescido de 32% para 35%, retomando o patamar do início do mês, após ter oscilado os mesmos três pontos para baixo no levantamento de 10 e 11 de setembro em comparação com pesquisa dos dias 3 e 4. No panorama atual, Serra e Russomanno disputariam um segundo turno, com Russomanno vencendo com 57% contra 31% de Serra, segundo simulação do instituto. O candidato Gabriel Chalita (PMDB) teria se estabilizado com 8%, de acordo com a pesquisa, seguido por Soninha Francine (PPS), que oscilou 1 ponto para baixo e aparece com 4%. A pesquisa, que entrevistou 1,8 mil pessoas nos dias 18 e 19 de setembro, foi divulgada nesta quinta-feira pelo jornal e causou espécie ao coordenador-geral da campanha de Haddad, o vereador Antonio Donato (PT-SP).
– Na verdade, a grande mídia se alinha com a única bala que ela tem para tentar salvar o Serra nessa eleição: é dar uma super-dimensão à questão do chamado ‘mensalão’. Mas eles perderam duas vezes a eleição falando de ‘mensalão’ (Lula,em 2006, Dilma, em 2010) e vão perder a terceira – afirmou à repórter Conceição Lemes, do sítio Viomundo.
Na opinião de Donato, o diário que integra o grupo conhecido como Partido da Mídia Golpista (PIG) “distorceu totalmente a informação” em uma matéria na qual parece que Haddad quer afastar sua imagem de réus no processo do ‘mensalão’, como o ex-deputado José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoíno.
– Primeiro que não é o Haddad que fala. É uma peça na Justiça que fala. E o que a peça na Justiça diz é que a maneira como a questão foi abordada é que é degradante. Na verdade, degradante é ter um jornal que se presta a distorcer, mentir… A ligação Serra-mídia é antiga e umbilical. O desespero da campanha do Serra contamina a mídia. O Serra, por sua vez, é realimentado pelo desespero da mídia que tenta salvá-lo. Mas o Serra não estará no segundo turno. A ‘grande mídia’ está tentando mostrar uma realidade sobre o PT e a candidatura Haddad que a população não enxerga dessa maneira. Eles (da mídia conservadora) tentam manter um núcleo duro de antipetismo, que é forte na cidade de SP. Nós sabemos disso. Mas esse núcleo duro está se desagregando graças ao governo Kassab, ao Serra, ao cansaço, ao enjôo – ou seja lá o nome que se dê – a um político que a cidade quer virar a página. São Paulo decidiu virar a página em relação ao Serra e isso os deixa (mídia ligada à direita) muito atordoados – afirmou aoViomundo.
Quanto às últimas pesquisas de opinião, Donato foi claro ao afirmar que notrackking (pesquisa instantânea) desta quarta-feira, realizado pelo PT, o candidato Haddad estaria 2 pontos à frente de Serra.
– Mais precisamente nós estamos com 18 e o Serra com 16 – disse, com Russomanno aparecendo em primeiro lugar com 35 pontos.
Arrecadação
Para o jornalista Renato Rovái, editor da revista Fórum, a pesquisa Datafolha “parece estar forçando a mão na margem de erro”. Segundo Rovái, “o resultado (Russomano, 35; Serra, 21; Haddad, 15; Chalita, 8; Soninha, 4) é bem diferente dos treckings dos candidatos e das pesquisas que empresas utilizam para definir onde aplicam seus tostões. Em nenhum desses levantamentos Serra tem vantagem de seis pontos. Em alguns casos, chegava a dois, mais isso há duas semanas”.
“No entanto, essa não é a primeira nem a última vez que o Datafolha solta uma pesquisa que depois vai sendo corrigida com a proximidade das eleições. Alguns costumam perguntar, mas por que o instituto faz isso se o resultado da eleição não vai mudar? Mais do que o efeito psicológico que um resultado adverso neste momento acarreta a uma candidatura, pior efeito é na arrecadação. Este pode ser devastador. E no caso de Serra, seria a pá de cal que falta para enterrar de vez sua candidatura. Afinal seu índice de rejeição já afastou muitos doadores”, continuou.
Para o analista político, “esse é o nó da questão”. Ele explica que as pesquisas, nesse momento da campanha, a um mês do dia das eleições, prestam-se muito mais para “arrecadar do que para ajudar na definição do resultado final”. Da mesma forma, devido ao prazo mais estendido, se um instituto forçar na margem de erro, “tem espaço suficiente para corrigir o resultado até o dia da eleição”.
Para o advogado e editor do Blog da Cidadania, Eduardo Guimarães, no entanto, a discussão é ainda mais séria, pois a intenção do Datafolha ao possivelmente alterar os resultados das últimas pesquisas de intenção de voto “constitui uma verdadeira afronta ao eleitorado paulistano e, portanto, tem que ser esclarecida”.
“Resumindo, o Datafolha traz uma reviravolta no que vinha acontecendo e mostra queda de Fernando Haddad (15%) e subida de José Serra (21%). Já o Vox Populi, aponta continuidade tanto da subida do candidato do PT (18%) quanto da queda do candidato do PSDB (17%)”. A esse fato, soma-se entrevista que a jornalista Conceição Lemes com o Antonio Donato “na qual ele afirma que o Datafolha está distorcendo números para beneficiar Serra”, apontou.
“Para quem não sabe, é crime fraudar pesquisas eleitorais. Dá até cadeia. É nesse contexto que se conclui que há realmente algo de muito estranho na diferença entre as tendências apontadas por cada instituto na eleição paulistana. Alguns podem achar que eventuais manipulações ‘dentro da margem de erro’ ou próximas a ela podem ficar impunes. Engano. Há, sim, como detectar se houve manipulação dos dados coletados. Em poucas palavras, os resultados que as pesquisas mostram são produtos de relações numéricas. Um número pode estar dentro da margem de erro em relação a outro, mas, numericamente, ou é maior ou é menor ou é igual”, desvenda.
Para descobrir se o Datafolha ou o Vox Populi aproveitaram-se da “margem de erro” para modificar números que não agradaram “basta contar os dados das fichas de entrevista”, afirmou Guimarães.
“Vale lembrar, olhando a questão da perspectiva da Justiça, que só o que se pode pedir a ela é que aceite investigar a diferença suspeita entre os números daqueles institutos e ao menos uma acusação de manipulação feita por um dos atores envolvidos. A Justiça Eleitoral, por sua vez, já aceitou investigar pesquisas a pedido deste blog e da ONG Movimento dos Sem Mídia ainda em 2010 e mandou a Polícia Federal abrir sindicância. Em tese, portanto, não será necessário recorrer à Justiça Eleitoral, pois a investigação está aberta. À PF haverá que oferecer, também, noticiário francamente desfavorável ao PT que a Folha de São Paulo, dona do Datafolha, vem produzindo incessantemente”, concluiu.
Correio do Brasil