Os países mais ricos do mundo se recusam teimosamente a ajudar os países cuja população está à beira da morte devido à fome. Números recentes da ONU relativos ao subfinanciamento da ajuda humanitária urgente mostram que os países doadores evitam contribuir até mesmo para a assistência de emergência pedida pela ONU.
Exemplos recentes. No início de março, as agências humanitárias da ONU suplicaram “doadores” a fazer urgentemente contribuições para fundos de ajuda à
República Centro-Africana (RCA) e ao Sudão do Sul. Foi advertido que a escala do desastre nesses países está crescendo constantemente. No entanto, esses apelos não impressionaram os doadores. Dos 552 milhões de dólares para a RCA foi obtido menos de um sexto, e de 1,27 bilhão para o Sudão do Sul conseguiram cerca de um quinto.
E já em abril o Sudão do Sul não recebeu para necessidades urgentes 887 milhões de dólares, ou cerca de 70 por cento do plano para o primeiro semestre. Várias organizações da ONU foram forçadas a declarar que, com tão baixos níveis de financiamento, elas não conseguirão lidar com a crise humanitária no Sudão do Sul. O coordenador humanitário da ONU para o Sudão do Sul, Toby Lanzer, clarificou a situação em entrevista à Rádio Tamazuj sudanesa: “Se o financiamento dos doadores não for disponibilizado agora, seremos incapazes de satisfazer as necessidades mais básicas para manter as pessoas vivas e prevenir um declínio catastrófico na segurança alimentar de milhões de pessoas em risco já este ano.”
E as coisas não estão melhor nos países onde recentemente foram realizadas ou estão ainda em curso dispendiosas operações especiais envolvendo contingentes militares de países ricos. Eis um relatório do Fundo Central de Resposta a Emergências das Nações Unidas (CERF na sigla inglesa de Central Emergency Response Fund). O Mali, onde no ano passado a França combateu, recebeu menos de 50% dos fundos solicitados, e excluindo os produtos alimentares foram só 42%. Exatamente o mesmo percentual dos prometidos 700 milhões de dólares chegou ao Iêmen. Aqui, com a ajuda dos Estados Unidos, em 19 de abril foram mortos... 63 militantes da Al-Qaeda, mas quantos milhares de cidadãos deste país a fome e o desespero levarão às fileiras de extremistas?
Estranhamente, o aliado a partir de cujo território estão sendo destruídos terroristas no Iêmen, na Somália e em outros países vizinhos do Corno da África, tão pouco recebe dinheiro. A maior parte do PIB do Djibuti, localizado neste ponto estratégico, provém dos pagamentos pela locação de terrenos para as bases militares dos Estados Unidos, França, Alemanha, Itália, Espanha e até mesmo do Japão. Isso não é suficiente, e a ONU pede para Djibuti dinheiro e comida. E este ano, segundo dados do CERF, não incluindo alimentos, o país recebeu... 14% dos fundos prometidos.
Se eles tratam assim os aliados, o que espera os inimigos? Em 23 de abril mais uma notícia veio de Genebra. Dirigentes de cinco agências humanitárias da ONU anunciaram que dos 6,5 bilhões de dólares solicitados ainda no final do ano passado para ajuda humanitária urgente à Síria foram recebidos apenas 1,2 bilhões.
Está aumentando o fluxo de refugiados da Síria para os países vizinhos – Egito, Iraque e Turquia. O Egito, onde no ano passado se encontravam 130 mil refugiados sírios, recebeu menos de metade dos 66 milhões de dólares prometidos para sustentá-los. O Iraque, com 205 mil refugiados existentes e 400 mil projetados este ano, recebeu 150 milhões de dólares em vez de 311 milhões. A Turquia, com meio milhão de refugiados, recebeu 137 dos 372 milhões de dólares prometidos e foi forçada a alocar para ajuda aos refugiados mais de 1 bilhão de dólares em recursos próprios. E este ano esperam lá um milhão de refugiados.
Se não há dinheiro para ajudar, valerá a pena agravar a situação na Síria? Na luta contra o regime, alguns países estão dispostos a multiplicar o sofrimento de pessoas inocentes. Assim, recentemente os EUA retornaram ao plano proposto ainda no ano passado pelo general David Petraeus. Ele sugere fornecer à oposição síria armas modernas e fechar o céu sobre o país para a aviação do Exército do governo. É evidente que o único resultado será o prolongamento do conflito, o aumento do número de refugiados, a expansão da catástrofe humanitária, bem como a preservação das posições de negócios que lucram tanto com os próprios conflitos como com a mitigação das consequências. Talvez essa seja a essência dos problemas das “guerras infinitas” e do desamparo humanitário?
Por Vadim Fersovich Foto: East News/Evelyn Hockstein/CARE/Polaris