O Ministério Público Federal (MPF) publicou quinta-feira (8) a carta de conclusões do seminário Polícia Democrática e Direito à Segurança, ocorrido em março deste ano, em que apresenta medidas para a "superação da falência do modelo atual de segurança pública" e a"consolidação de uma polícia democrática". Segundo a carta, é preciso "rever as normas infraconstitucionais reguladoras da atividade policial herdadas do regime militar, para adequá-las ao paradigma da Constituição de 1988. Elas, em boa parte, não foram recepcionadas pela ordem constitucional democrática e esse fato precisa ser reconhecido e revertido".
O documento foi elaborado a partir dos debates entre servidores e membros dos Ministérios Públicos Federal e do Estado de São Paulo, defensores públicos, policiais militares, policiais civis, guardas civis Metropolitanos, representantes de organizações da sociedade civil, jornalistas, professores, profissionais de segurança pública e estudantes.
Para o MPF, um dos principais problemas é o alto número de homicídios no país, ao lado da baixa capacidade de solução dos casos. Segundo estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU), 11% dos homicídios no mundo, em 2012, ocorreram no Brasil, que possui somente 2,9% da população mundial. De acordo com o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), 56.804 pessoas foram assassinadas no Brasil em 2013.
Segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os policiais brasileiros foram responsáveis por 3.009 mortes em 2014. Número maior do que o de vítimas de latrocínio ou de lesão corporal seguida de morte. No mesmo ano, 394 policiais perderam a vida, a maioria fora do horário de serviço. "Esses dados explicitam que o mesmo Estado que tem dificuldade em controlar o uso da força letal por seus agentes também falha em garantir cuidado e proteção aos seus profissionais, os quais ainda padecem do desrespeito aos seus direitos no exercício da profissão", diz a carta.
Entre as medidas sugeridas para reformar o atual modelo de segurança pública, estão o fortalecimento da missão da polícia como defensora da cidadania e não como combatente a "inimigos internos"; e a instituição de mecanismos de controle social, político e judicial das instituições de segurança pública, garantindo que as polícias sejam responsivas à sociedade civil, transparentes e obrigadas à prestação de contas de suas atividades.
O documento também cobra que o Ministério Público (MP) exerça, de forma eficaz, "o controle externo da atividade policial, nas vertentes difusas e concentrada, com a prestação de contas de sua atuação em órgãos de controle social". E que acompanhe, desde o início, todas as denúncias e investigações "de mortes decorrentes de ação policial e de tortura, com a designação de promotores e equipes de apoio que devem comparecer ao local dos fatos e interagir com a produção das provas".
O documento propõe ainda redefinição da relação entre as polícias e o Ministério Público, de forma que o MP participe de forma mais próxima e ativa da investigação de crimes graves, para garantir uma colheita de provas adequadas às necessidades da acusação. E que se priorize os recursos da segurança pública para a prevenção e investigação de homicídios e outros crimes graves.
"O Brasil possui uma democracia jovem. A herança do nosso passado autoritário, sobretudo dos períodos mais recentes, ainda foi pouco discutida, apesar do importante trabalho de resgate realizado pela Comissão Nacional da Verdade, que apresentou pontos importantes a serem superados na construção, enraizamento e capilaridade das instituições substancialmente democráticas", afirma a carta.
Créditos: Rede Brasil Atual