Depois quase 11 horas de discussão, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara rejeitou o parecer do relator Sergio Zveiter (PMDB-RJ), que pedia admissibilidade do pedido de abertura de processo contra o presidente Michel Temer, por corrupção passiva. O placar foi de 40 votos contrários a 25 favoráveis.
O resultado, entretanto, não foi tão comemorado pela base aliada, em confronto com os oposicionistas que protestaram aos gritos de “Fora Temer”. Os partidos da oposição contam com a votação da matéria no plenário da Casa, quando todos os deputados terão de se manifestar e enfrentar o eleitorado, caso queiram defender o presidente – cuja situação política é considerada, apesar dessa vitória, cada vez mais frágil.
Os deputados da oposição acharam que o resultado foi “manipulado”, em função das articulações que resultaram em trocas de titulares do colegiado. Em compensação, a votação da demanda pelo plenário da Casa tem tudo para ficar para agosto, por ausência de quórum, conforme chegou a admitir o próprio presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), no início da tarde.
Para as siglas contrárias a Temer, que esperavam esse resultado na comissão, diante das várias articulações do Planalto nos últimos dias (e que incluíram, inclusive, oferecimento de cargos no Executivo e liberação de emendas do Orçamento para os deputados), a discussão foi positiva. A aposta maior é que a grande briga sobre a questão será travada no plenário do Senado.
Conforme o regimento interno da Casa, mesmo com a rejeição do parecer do relator, deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ), a matéria terá de seguir para o plenário. Só que o que seguirá será um texto substitutivo e não mais o relatório de Zveiter. O novo texto terá como relator o deputado Paulo Abi Ackel (PSDB-MG).
São necessários 172 votos favoráveis a Temer para garantir que a denúncia não seja acolhida contra ele. E 342 votos para conseguir a aprovação do pedido da procuradoria-geral da República contra o presidente. Esta tarde, em conversas reservadas, tanto oposicionistas como integrantes da base do governo deixaram nítida a incerteza do governo quanto às chances no plenário. O Palácio do Planalto, que tanto vinha atuando pela celeridade da votação, também recuou e agora já é tida como certa a votação apenas depois das próximas duas semanas de recesso.
‘Baralho viciado’
Para o deputado Chico Alencar (Psol-RJ) o que se viu na CCJ foi “um baralho viciado pelo ‘toma lá, dá cá’ e pela compra de votos feita pelo governo”. “Mas isso vai ser derrubado em plenário pela sua superficialidade”, afirmou ele. Já Sergio Zveiter disse que o resultado observado na comissão não é definitivo e que a população está consciente da manipulação que foi observada na troca de representantes da comissão.
“Cumpri com minha obrigação e não estou arrependido. Não vejo como a Câmara dos Deputados não acolher esta denúncia, em nome da imagem do parlamento brasileiro. Fui chamado de traidor por ser do PMDB, mas a meu ver, quem traiu o país foram essas práticas espúrias observadas por um peemedebista, não eu”, destacou Zveiter. Ele se referiu à gravação entre Temer e o empresário Joesley Batista, no qual o presidente foi flagrado, que envolveu o pagamento de propinas ao ex-deputado Eduardo Cunha e para o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (apontado na conversa como seu “homem de confiança”).
Henrique Fontana (PT-RS) reiterou que a denúncia contra o presidente possui “robustez, consistência e farto material comprobatório”. “Não há como, racionalmente, a denúncia ser rejeitada. O que está acontecendo tem a ver com um quórum artificial criado na CCJ, mediante as trocas feitas de vários titulares pelos partidos da base aliada do governo. O que cresce no Brasil, e temos cada vez mais consciência disso, é o aumento do número de pessoas que querem que Temer seja investigado”, afirmou Fontana.
O deputado Alessandro Molon (Rede-RJ), que também é professor de Direito Constitucional, afirmou que a vitória do governo na CCJ torna muito mais difícil o seu livramento no plenário da Câmara, porque a opinião pública está acompanhando os debates dos últimos dias de forma intensa.
“Não é apenas uma gravação que nos faz concluir pela aceitação da denúncia, são todos os indícios existentes de que havia uma organização criminosa para prejudicar o povo brasileiro e conquistar benefícios para esse grupo. São indícios muito claros e, também, as circunstâncias da conversa entre Temer e Joesley Batista, tarde da noite, no porão do Palácio do Jaburu, onde também trataram sobre a compra de um procurador do ministério público e de um juiz”.
Contradição em livro
Wadih Damous (PT-RJ) destacou que “o povo brasileiro merece saber e conhecer a conduta do seu presidente”. “Não podemos impedir que o país não chegue a essa fase (de investigar Temer). Só ao Supremo Tribunal Federal (STF) compete dizer se a denúncia é verdadeira ou não, mas enquanto parlamentares, temos a obrigação de fazer com que tal denúncia chegue ao STF”.
Damous citou um livro de autoria do próprio Temer, na qual o ele afirma que, numa denúncia contra o presidente da República, não se deve esperar que se passem os anos para que a rejeição seja feita pelo povo nas urnas e sim que, antes disso, o Congresso Nacional assuma a responsabilidade de resolver a questão e decidir.
A base do governo usou a estratégia de desqualificar mais uma vez a denúncia. O deputado Alceu Moreira (PMDB-RS) disse que se o constituinte quisesse que o julgamento a ser feito pela CCJ e pela Câmara como um todo fosse meramente técnico, não iria pedir a autorização da Câmara para acolhimento da denúncia pelo STF, motivo pelo qual a decisão deve ser política.
Ele aproveitou para falar do que considerou como “feitos positivos” do governo, nos últimos meses. No mesmo tom, outros parlamentares ligados ao Planalto disseram que a denúncia é inepta e criticaram o parecer do relator, que usou o princípio “in dubio pro societate” (na dúvida, a sociedade) para justificar seu voto. “Isso não existe”, disse o deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), que chegou a discutir com Sergio Zveiter.
Pouco antes do resultado, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), comunicou aos aliados de Temer que só deverá abrir a votação da matéria no plenário se houver pelo menos 342 deputados. E como a oposição não pretende marcar presença até que esse quórum seja atingido, o processo terá de ser adiado, o que tende a provocar o desgaste do presidente. Apesar da votação ter sido realizada, a reunião da CCJ continua. Confira abaixo como votou cada deputado na CCJ:
Contra a aceitação da denúncia
Alceu Moreira (PMDB-RS). Andre Moura (PSC-SE) Antonio Bulhões (PRB-SP) Arthur Lira (PP-AL) Beto Mansur (PRB-SP) Bilac Pinto (PR-MG) Carlos Bezerra (PMDB-MT) Carlos Marun (PMDB-MS) Carlos Melles (DEM-MG) Cleber Verde (PRB-MA) Cristiane Brasil (PTB-RJ) Daniel Vilela (PMDB-GO) Danilo Forte (PSB-CE) Darcísio Perondi (PMDB-RS) Delegado Éder Mauro (PSD-PA) Domingos Neto (PSD-CE) Edio Lopes (PR-RR) Elizeu Dionizio (PSDB-MS) Evandro Gussi (PV-SP) Evandro Roman (PSD-PR) Fabio Garcia (PSB-MT) Fausto Pinato (PP-SP) Genecias Noronha (SD-CE) Hildo Rocha (PMDB-MA) José Carlos Aleluia (DEM-BA)Juscelino Filho (DEM-MA) Laerte Bessa (PR-DF) Luiz Fernando Faria (PP-MG) Magda Mofatto (PR-GO) Maia Filho (PP-PI) Marcelo Aro (PHS-MG) Milton Monti (PR-SP) Nelson Marquezelli (PTB-SP) Paes Landim (PTB-PI)
Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) Paulo Maluf (PP-SP) Rogério Rosso (PSD-DF)Ronaldo Fonseca (PROS-DF) Thiago Peixoto (PSD-GO) Toninho Pinheiro (PP-MG)
A favor da aceitação da denúncia
Afonso Motta (PDT-RS) Alessandro Molon (Rede-RJ)Betinho Gomes (PSDB-PE)
Chico Alencar (PSol-RJ) Fábio Sousa (PSDB-GO) José Mentor (PT-SP) Júlio Delgado (PSB-MG) Jutahy Junior (PSDB-BA) Laercio Oliveira (SD-SE) Luiz Couto (PT-PB)
Marco Maia (PT-RS) Marcos Rogério (DEM-RO) Maria do Rosário (PT-RS) Patrus Ananias (PT-MG) Paulo Teixeira (PT-SP) Pompeo de Mattos (PDT-RS) Renata Abreu (Podemos-SP) Rocha (PSDB-AC) Rubens Bueno (PPS-PR) Rubens Pereira Júnior (PCdoB-MA) Sergio Zveiter (PMDB-RJ) Silvio Torres (PSDB-SP) Tadeu Alencar (PSB-PE)Valmir Prascidelli (PT-SP)Wadih Damous (PT-RJ)
Abstenção
Rodrigo Pacheco (PMDB-MG).