A construção de um dos parques industriais mais avançados e integrados do mundo permitiu ao Brasil abandonar, a partir de 1930, a condição de atraso imposta pela antiga e longeva sociedade agrária. Ainda que tardio, o avanço do capitalismo industrial transcorreu concomitante com o estabelecimento de uma nova e complexa sociedade urbana rica, porém permeada por significativa desigualdade econômica, social e de poder.
A permanente postergação da realização das reformas clássicas do capitalismo contemporâneo, como a agrária, tributária e social, impossibilitou que a elevação ao patamar dos 10 países mais ricos fosse acompanhada por uma sociedade justa e democrática. Com isso, a prevalência de enorme concentração de pobres e camadas de trabalhadores informais, a maioria dependente da oferta de serviços às famílias ricas (piscineiros, domésticos, passeadores de cães, seguranças, motoristas particulares, jardineiros, manicure, pedicure, personal trainer, entre outros)
Por outro lado, a ascensão do receituário neoliberal durante os governos dos Fernandos (Collor, 1990-1992 e Cardoso, 1995-2002) impôs inegável inflexão à anterior trajetória industrializante da economia nacional. A consequência direta foi a precoce transição para a sociedade de serviços em decorrência da simultânea queda relativa da produção, da renda e do emprego na agropecuária e indústrias de transformação e construção civil.
A transição antecipada da sociedade industrial para a de serviços terminou não sendo mais a abrupta e intensa diante dos governos liderados pelo PT (2003-2016) que buscaram recuperar o parque industrial através das políticas de conteúdo nacional, de financiamentos produtivos, desoneração fiscal, entre outras iniciativas. Assim, as indústrias de petróleo e gás, naval, fármacos, automobilístico, da construção civil, entre outras, voltaram a ganhar proeminência na produção, emprego e renda.
Apesar disso, a volta da aplicação do receituário neoliberal pelo governo Temer desde o golpe de 2016, passou a produzir significativa retomada do desmonte do parque industrial brasileiro. Isso é que se pode constatar diante da profusão de exemplos associados à generalizada regressão econômica vislumbrada no complexo de petróleo e gás, na indústria naval, na construção civil e outros.
Também no setor químico podem ser constatadas importantes transformações no Brasil, como a fusão dos grupos Du Pont e Dow Chemical. Além disso, o recente anúncio da negociação de venda da petroquímica Braskem pela Odebrecht para uma corporação transnacional com sede na Holanda (LyondellBasell) impõe esvaziamento ainda maior na participação da presença do capital privado nacional no setor produtivo. Somente a aquisição da Braskem pode levar os seus 8 mil empregos distribuídos por 40 fábricas pela multinacional holandesa que detém 13 mil ocupados dispersos em suas 55 fabricas instaladas em 17 países.
Diante disso, percebe-se como o governo Temer se especializa no desmonte da industrialização nacional. Para tanto, põe fim ao antigo tripé de capitais que havia permitido o salto econômico que consolidou um dos parques de manufatura mais importante do lado sul do planeta Terra.
A continuidade do processo entreguista da nação pelo governo Temer protagonizado pela privatização do setor produtivo estatal encontra maior eco com o avanço da desnacionalização da indústria empossada pelo capital privado nacional. Tudo isso, com o possível fechamento das empresas operando no país (como no caso da venda da Embraer), a transferência de tecnologia nacional para estrangeiro (como no caso da exploração da camada do pré sal pela Petrobrás), o que compromete ainda mais as possibilidade de manutenção da soberania nacional. Por Marcio Pochmann, professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Créditos: Rede Brasil Atual