sábado, 10 de fevereiro de 2018

Empresas privadas não são mais eficientes que públicas, diz Dieese

O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) lançou, no final de janeiro, uma nota técnica sobre o impacto das privatizações na economia, explorando a importância das empresas públicas em diversos países do mundo. Batizado de “Empresas estatais e desenvolvimento”, o documento não só faz análises históricas, como também aborda as medidas do governo Michel Temer na área. 

O estudo foi preparado pela equipe do Dieese no Rio de Janeiro, reunindo especialistas em temas como saneamento, petróleo e produção energética. Ao Brasil de Fato, Cloviomar Caranine, economista da entidade e um dos integrantes do grupo que formulou a nota, explica que no contexto atual há uma ofensiva das empresas sobre setores públicos, decorrente do excesso de liquidez financeira. Ou seja, uma busca do setor privado em converter dinheiro em bens.

A busca por empresas públicas, segundo Caranine, tem uma razão óbvia: elas são lucrativas. Entre 2002 e 2016, as empresas públicas federais retornaram em média R$ 19 bilhões anualmente ao estado brasileiro em dividendos. 

“Não é verdade que as empresas privadas são mais eficientes que as públicas. A gente mostra isso. Como os outros países, até mesmo os de orientação neoliberal, tratam suas empresas estatais e qual o papel delas lá? Elas são importantes e esses países têm elas enquanto estratégicas. Ela pode ser usada como política do governo para fazer avançar o atendimento à população e também como uma importante alavanca de desenvolvimento. Alguns países que lá atrás tomaram a decisão de privatizar alguns setores, agora estão reestatizando”, diz. 

Um dos exemplos de reestatização que vem ocorrendo no mundo é o de fornecimento de água e saneamento, o que põe o país na contramão mundial. “O mundo está estatizando, o Brasil está privatizando”, resume ele. 

O economista cita uma série de razões para manutenção de empresas públicas, relacionadas à soberania nacional. Segundo ele, investimentos de longo prazo não são assumidos pela iniciativa privada, como a construção de usina hidrelétricas e a pesquisa que levou à descoberta do pré-sal. Outro elemento é garantir os serviços essenciais à vida, como saúde, educação, água e energia. O último ponto trazido por Caranine é a possibilidade de evitar monopólios privados, como no setor bancário.

O integrante do Dieese rebate os argumentos do Planalto para realizar as privatizações. Além das já realizadas, o governo federal tem em sua agenda a privatização da Eletrobras, estatal de energia.

"O que está acontecendo é que o governo vive uma dificuldade em relação ao ajuste fiscal. Há menor arrecadação e seus gastos se mantendo ou crescendo. Há, portanto, déficit. Como saída, o governo Temer faz uma opção de, por um lado, tentar estimular o investimento privado e, por outro, aumentar a arrecadação vendendo as empresas estatais. Como efeito, há forte redução da presença de empresas estatais e públicas na prestação de serviços à sociedade. Isso já está acontecendo. Segundo, uma maior dependência de investimento, recurso e até produtos e serviços estrangeiros”, diz.

Na questão da dependência, ele cita o exemplo dos derivados do Petróleo, que gera consequências diretas ao consumidor. “O Brasil está tomando a decisão de reduzir a Petrobras, reduzir seu refino e a oferta de derivados do petróleo, para atrair empresas, que vão importar. Um dia desses teve um furacão nos Estados Unidos e o preço da gasolina subiu no Brasil e houve risco de faltar gasolina. O Brasil está importando e poderia estar refinando”, aponta.

Caranine afirma que é cedo para apontar todos os possíveis efeitos das privatizações promovidas por Temer, mas afirma que historicamente elas sequer resolvem os problemas fiscais citados pelo governo. Ele lembra que em 1995 a dívida pública representava 28% do Produto Interno Bruto. Em 2003, após o processo de privatizações no governo FHC, a dívida atingiu o patamar de 52%. 

Em sua visão, isto ocorre pois as privatizações não tocam o rentismo, principal problema econômico do país. A lógica é simples: com o aumento de 1% na taxa de juros, diz ele, a dívida aumenta em um ano o equivalente ao valor de uma empresa pública. Por Rafael Tatemoto / Edição: Simone Freire.


Créditos: Brasil de Fato

Multinacionais levam 22% do petróleo brasileiro

Multinacionais levam 22% do petróleo do brasileiro
Em 2017, as petroleiras estrangeiras e as pequenas e médias produtoras nacionais (como Queiroz Galvão, PetroRio e Dommo Energia) produziram, juntas, em média, 582 mil barris/dia de petróleo, o que representa um aumento de 25% ante 2016. E a participação da Petrobras na produção nacional recuou 3,7 pontos percentuais, para 77,8%, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP).
O crescimento acelerado de terceiros se trata de um movimento natural, já que a principal fronteira de produção do país, o pré-sal, concentra projetos operados pela Petrobras em parcerias com sócios. Em 2017, por exemplo, a desconcentração foi puxada, sobretudo, por companhias como Shell, Petrogal e Repsol Sinopec (sócias da estatal em Lula e Sapinhoá, os maiores campos do país.
Para este ano, a expectativa é que a trajetória de crescimento da parcela fora da Petrobras se intensifique, em que pese o fato de o número de projetos operados por outras empresas ainda ser baixo. Com exceção de Atlanta, operado pela QGEP no pós-sal da Bacia de Santos, não há perspectivas de que novos campos, operados por outras petroleiras, entrem em operação no país nos próximos anos. Fonte: Valor
Créditos: Nossa Política

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Desemprego e informalidade fazem Previdência deixar de arrecadar 25 bi

Um estudo divulgado pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) aponta uma arrecadação potencial superior a R$ 25 bilhões no ano para a Previdência Social que poderia ser obtida sem desemprego e o nível atual de informalidade no mercado de trabalho. Elaborado pela subseção do Dieese na entidade, o estudo considera a força de trabalho brasileira, medida pelo IBGE, e o impacto da eventual contribuição de desempregados e trabalhadores informais no país.
"Para receber um benefício como auxílio-doença, salário-maternidade, entre outros, é preciso contribuir para a Previdência Social. E sabemos que boa parte de quem se encontra na informalidade não consegue fazer esta contribuição. Precisamos de empregos de qualidade, com salário digno e relações formais para assegurar o direito de todos e todas ao sistema previdenciário brasileiro", afirma o presidente da Contag, Aristides Santos.
Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-C), do IBGE, mostra uma média, em 2017, de 90,6 milhões de ocupados e 13,2 milhões de desempregados no país. Entre os ocupados, 33,3 milhões de empregados com carteira e 10,7 milhões sem carteira assinada, além de 22,7 milhões de trabalhadores por conta própria, entre outras categorias.
Os ocupados tinham rendimento médio de R$ 2.141, caindo para R$ 1.234 entre os sem-carteira. O salário mínimo (R$ 937 no ano passado) era a remuneração de 48 milhões de pessoas, segundo estimativa do Dieese, número que corresponde a quase metade dos ocupados. O instituto estima que o reajuste de 1,81% no mínimo este ano (abaixo da inflação) representará um incremento de R$ 10,5 bilhões na economia, incluindo a arrecadação tributária.
O estudo parte da suposição de que todos os 13,2 milhões de desempregados estariam trabalhando e recebendo como remuneração o correspondente a um salário mínimo. Com 8% da contribuição previdenciária, haveria uma arrecadação mensal a mais de R$ 914,5 milhões – R$ 11,9 bilhões no ano, considerando o 13º.
Ainda por esse cenário, caso os 10,7 milhões de empregados sem registro contribuíssem para a Previdência Social, com o salário médio de R$ 1.234, a arrecadação adicional seria de R$ 1,06 bilhão por mês e R$ 13,7 bilhões/ano.
"A geração de emprego com carteira assinada bem como a formalização no mercado de trabalho diminuiria o suposto 'déficit' líquido previdenciário em 2017 na ordem de R$ 25,6 bilhões – isso desconsiderando nos cálculos os 22,7 milhões de trabalhadores por conta própria, 6,2 milhões de trabalhadores domésticos e 2,2 milhões de trabalhadores familiares auxiliares que, em sua maioria, estão fora do sistema previdenciário", diz a Contag.
Créditos: Rede Brasil Atual

Temer está provocando o povo, e país pode ter convulsão social, diz teólogo

Para Leonardo Boff, o governo de Michel Temer é ilegítimo e rompeu o pacto social do Brasil. - Créditos: Reprodução / TVT
O teólogo e escritor Leonardo Boff avalia que o governo de Michel Temer está “provocando o povo” e a consequência pode ser uma convulsão social. “Nossa tarefa é tentar evitar essa situação e fazer com que essa pressão toda coloque o Congresso para atuar em prol do povo, mas se acontecer essa sublevação, eles são os culpados”, afirmou, durante participação no programa Entre Vistasna TVT.

Um dos mentores no Brasil da Teologia da Libertação, Boff foi duro com Temer ao dizer que seu governo é ilegítimo e não deve ser reconhecido, pois rompeu o pacto social do país. Para o frei, é preciso recolocar o país no rumo do desenvolvimento e refazer o prestígio global que havia conquistado até poucos anos atrás, a partir das potencialidades e riquezas naturais brasileiras, o que, para ele virá com a eleição de um novo governo de perfil progressista. “O Lula pode resgatar a credibilidade do povo”, afirmou.

O teólogo avalia que Lula conseguiu abrir “brechas sociais” mas, apesar dos elogios, diz que o ex-presidente se equivocou ao não redistribuir a riqueza – que seria “tirar de quem tem demais para dar a quem tem de menos". É nesse contexto que Boff analisa a conjuntura que permitiu o impeachment de Dilma Rousseff e o golpe em curso no Brasil.

“Quando se deram conta de que as políticas sociais se tornariam políticas de Estado consolidadas, eles deram o golpe”, observou, ressaltando a necessidade de o país construir uma sociedade minimamente igualitária. “Vivemos uma luta de classes onde a classe operária sempre perde.” Ainda assim, disse acreditar na resistência aos retrocessos, na construção de um novo rumo para o país e na crença de que a sociedade não pode se manter indefinidamente na injustiça.

“O que nos faltou foi uma Bastilha”, afirmou, se referindo à revolta que pôs fim à monarquia na França em 1789. “A casa-grande continua com a mesma lógica, paga um salário como se fosse esmola. Temos que criar as mediações com políticos que lutam pela justiça e o Estado de bem-estar social.”

Durante o programa, gravado no Café do Sindicato dos Bancários, no Edifício Martinelli, centro de São Paulo, Leonardo Boff criticou o papel da Igreja Católica na conjuntura atual, em que movimentos sociais são perseguidos e há retrocessos em diversas áreas sociais. Para ele, nos últimos 30 anos os padres perderam sua capacidade "profética".

"Hoje temos uma Igreja enfraquecida, dividida, com alguma posição diante da Amazônia e da Previdência, mas que se calou diante da reforma trabalhista e do Estado de exceção que persegue. É uma Igreja adaptada à situação”, disse. Na sua visão, a missão da igreja é estar ao lado dos mais pobres e defender seus direitos. Apesar da opinião contundente, o teólogo por outro lado elogiou a postura do Papa Francisco e sua atitude de não apenas “dar discurso” para os pobres, mas sim ir ao encontro deles, estar onde eles estão.

E fez uma revelação: “A Dilma pode não falar, mas o Papa enviou uma carta de apoio durante o impeachment. Enquanto houver esse governo, ele não virá ao Brasil. Ele viria porque é um grande devoto de Nossa Senhora Aparecida, mas não veio. E não recebeu o Temer quando ele foi a Roma, porque ele é um homem de princípios”.

Boff defendeu um melhor diálogo com os grupos evangélicos dispostos a enfrentar as injustiças do Brasil, pois acredita ser preciso se comunicar melhor com os pobres e excluídos, e que os evangélicos têm uma linguagem mais apropriada para esse desafio. “Precisamos sim abrir dialogo com eles”, reconheceu. O programa Entre Vistas vai ao ar todas as terças-feiras, às 21h. Fonte: RBA.
Créditos: Brasil de Fato


quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Com lucros recordes em 2017, bancos fecharam mais de 17 mil postos de trabalho

Os três maiores bancos privados do Brasil – Itaú, Bradesco e Santander – tiveram, juntos, lucro líquido de R$ 53,8 bilhões. A cifra representa um crescimento de mais de 15% em relação a 2016. Somente o Itaú alcançou o maior lucro de uma instituição financeira na história do Brasil: R$ 24,8 bilhões.
De outro lado, o setor cortou muitos postos de trabalho. É o que lembra Ivone Silva, presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região.  
“O setor bancário fechou 17.905 postos de trabalho em 2017, de acordo com dados do Caged [Cadastro Geral de Empregados e Desempregados]. Para ajudar o Brasil a crescer, o setor bancário precisa começar a retribuir a sociedade, praticando juros civilizados, elevando a oferta de crédito, melhorando o atendimento à população através de contratações e contribuindo para melhorar as relações de trabalho e a estrutura salarial num país que ainda figura no topo do ranking mundial de desigualdade de renda”, diz.
Um dos pontos citados por Silva é um fator fundamental para compreender os lucros altos dos bancos brasileiros: os juros de empréstimos. É o que aponta também Vivian Machado, mestre em Economia Política e técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
“O que explica [os altos lucros] é o rentismo. Os lucros dos bancos são muito grandes por conta do spread: o que eles gastam para captar é muito inferior ao que eles cobram dos clientes. Quanto maior é a crise, maior é o risco, mais ele cobra. Se o país está em crise, eles emprestam menos, mas ganham em outras frentes”, indica. 
Machado afirma que os bancos encontram “saídas em qualquer cenário” e, mesmo com a alta do desemprego e queda no consumo, eles vêm aumentando as receitas por conta das taxas cobradas de clientes pela prestação de serviços, como a manutenção de contas.
A opinião é compartilhada por Roberto van der Osten, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf). Ambos dizem que só os valores desse tipo de receita possibilitam o pagamento de funcionários, uma das principais despesas destas instituições. 
“O Itaú teve de receita, só com essas tarifas, mais de R$ 35 bilhões. Essa receita vem crescendo ano a ano. Sozinha ela cobre toda despesa de pessoal”, aponta Silva.
Van der Osten ressalta que, além do fechamento de postos de trabalho, o lucro dos bancos não se reverte em melhores condições de trabalho para seus funcionários, pelo contrário: as situações a que são submetidos os trabalhadores e as trabalhadoras vem se agravando, o que deve piorar com a reforma trabalhista. O sindicalista cita como exemplos a prática de home office, que flexibiliza a jornada, e a estipulação de metas exageradas, acontecimentos “compensados” por shows e espetáculos “motivacionais”. 
“Os trabalhadores do ramo financeiro estão entre os mais afastados. É um dos setores que mais apresenta afastamento por distúrbio mental e vários outros tipos de doença do trabalho. O que é 'curioso', porque é um emprego em que aparentemente não existe penosidade em sua execução. Ele é um trabalho onde se enfrenta várias situações”, analisa. 
O lucro do Banco do Brasil deve ser anunciado dia 22 de fevereiro. A divulgação deve confirmar a expectativa de menor presença relativa das instituições públicas no setor financeiro em comparação a anos anteriores. Edição: Nina Fideles.
Crédito: Brasil de Fato

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

O fracasso do golpe e o aprofundamento da injustiça

Instalado desde 2016, o programa denominado Ponte para o Futuro pelo governo Temer não produziu fracasso maior, não fossem medidas de natureza bastarda do keynesianismo, contraditoriamente adotadas ad hoc pela equipe econômica neoliberal – aquela dos sonhos do mercado. A mensagem original era a do ajuste fiscal e do resgate da credibilidade para fazer com que a economia voltasse a crescer pela retomada dos investimentos privados.
Mas o que se viu foi um protundo fracasso. Em meio ao prolongamento da recessão, o ajuste fiscal produziu mais desajuste nas contas públicas, sufocando os governos federal, estaduais e municipais e degenerando ainda mais as condições de vida da população. Os péssimos indicadores de avaliação do governo Temer apenas confirmam a realidade nacional.
No mesmo sentido, a credibilidade esperada mesmo com a falsa propaganda do novo governo austero não apareceu. E os investimentos terminaram seguindo a mesma rota de queda, o que jogou por terra toda a ladainha da economia pelo lado da oferta, cuja redução de custos (sociais e trabalhistas) e o esvaziamento do papel do Estado gerariam o melhor dos mundos. Onde?
Diante da recessão sem fim e o desastre, mais uma vez, das políticas neoliberais, o retorno de certa heterodoxia, de estímulo da demanda foi rapidamente acionado. Para tanto, a liberação de renda pelo Estado com o intuito de estimular o consumo foi providenciada.
Assim, a injeção de recursos através das contas inativas tanto do FGTS como do PIS/Pasep e o perdão tributário liberaram recursos adicionais ao consumo que contou ainda com a queda da inflação e da taxa nominal de juros. Dessa forma, o governo Temer conseguiu que ano de 2017 terminasse empatado, com sinais de estagnação do PIB e sem horizonte confiável de recuperação sustentável da economia.
Mas isso não seria pouca coisa frente ao desastre anunciado pela fajuta política econômica implementada. A evidente alegria do condomínio de interesses apoiadores dos golpistas vem sendo propagandeada recorrentemente pelos meios de comunicação, concomitante com todo o apelo para a aprovação da injusta reforma da previdência. 
Destaca-se que no governo Dilma, por exemplo, a variação positiva da economia – bem maior - que a produzida por Temer era denominada de pibinho. Agora, somente a inexistência de variação negativa do PIB vem sendo valorizada ao extremo.
Tudo isso, contudo, não se mostra suficiente para permitir o surgimento de candidatura pelo lado dos golpistas suficiente para indicar vitória no pleito presidencial, em condições livres e democráticas, no ano 2018. Por isso e sem alternativas, o que resta ao golpismo fracassado é a persistência no avanço da injustiça sobre a candidatura de Lula, a única que desponta, possivelmente, como vitoriosa. 
Suspender as eleições presidenciais como a ditadura militar fez em 1965 não estaria descartada, como medida de extremo desespero. Mas antes disso, há diversas possibilidades: o presidencialismo mitigado, o parlamentarismo e, sobretudo, a exclusão de Lula. 
Nesta perspectiva que a decisão do TRF-4 não poderia ter causado surpresa. Simplesmente porque o golpe continua ativo e em curso. Quanto maior o seu fracasso em produzir oportunidades de continuidade, mais ampliado tende a ser o aprofundamento das injustiças no Brasil. Por Marcio Pochmann  professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)
Créditos: Rede Brasil Atual

Fiocruz testa droga contra febre amarela

As imensas filas formadas nos postos de vacinação são justificadas: a febre amarela mata. De acordo com estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), metade dos casos que chegam a fase tóxica terminam com a morte do paciente. Atualmente, não existe um tratamento para o combate ao vírus, apenas para amenizar os sintomas, mas um medicamento desenvolvido para a hepatite C pode virar esse jogo. Testes em laboratório com o sofosbuvir — comercializado pela farmacêutica Gilead com a marca Sovaldi — demonstraram eficácia contra o vírus da doença em células e camundongos. Por causa da epidemia, ele está sendo experimentado em humanos.
Os testes laboratoriais foram realizados pela equipe do pesquisador Thiago Moreno, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde da Fiocruz. Os resultados ainda não foram publicados, mas, segundo Moreno, sua eficácia é consistente com a utilização farmacológica da droga. Com esse dado em mãos, hospitais e centros de pesquisa nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais deram início ao uso compassivo do medicamento em pacientes com febre amarela.
O uso compassivo acontece quando um medicamento é receitado para uma finalidade não aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No caso, o sofosbuvir tem indicação para o tratamento da hepatite C, não da febre amarela. Ele requer acordo prévio entre médicos, pacientes e a farmacêutica responsável, e é autorizado segundo critérios de gravidade e estágio da doença e do quadro clínico, ausência de alternativa terapêutica e avaliação da relação risco benefício do medicamento.
— Nós temos o seguinte cenário: uma doença sem tratamento, com alta taxa de mortalidade; e uma droga descrita para outro fim, mas considerada segura e com histórico de efeito comprovado estudos laboratoriais. Diante dessa equação, a saúde pública precisa se mobilizar e agir — explicou Moreno. — O medicamento está sendo utilizado em pacientes em estado grave, que em princípio não teriam outra oportunidade de tratamento.
A equipe de Moreno liderou outro estudo parecido, que demonstrou a atividade do sofosbuvir contra o vírus da zika. Os resultados foram divulgados mês passado na prestigiada “Scientific Reports”, publicação científica do grupo Nature. Uma outra pesquisa, realizada no Canadá, revelou a ação do medicamento contra o vírus da dengue. Essa ação compartilhada é explicada por uma questão familiar: o vírus da hepatite C pertence à família Flaviviridae, a mesma dos causadores da dengue, zika e febre amarela, entre outras doenças.
— Esses vírus compartilham alguns componentes muito similares, em particular a enzima RNA polimerase, a parte mais conservada dos membros dessa família — apontou Moreno. — O RNA polimerase do vírus da febre amarela tem identidade superior a 90% em relação aos vírus da zika e da dengue.
No estudo sobre a zika, Moreno e sua equipe notaram que o RNA polimerase é apenas 25% idêntico ao do vírus da hepatite C, mas 80% dos aminoácidos que interagem com a droga estão conservados. Essa enzima é responsável pela replicação dos vírus e alvo da ação do sofosbuvir. Dessa forma, o medicamento impede que o antígeno se multiplique, controlando a infecção.
Ainda é cedo para avaliar o uso clínico do sofosbuvir no tratamento da febre amarela, mas mesmo que os resultados sejam positivos, existe uma barreira para a aplicação em grande escala: o Sovaldi é um medicamento caro. Uma consulta on-line mostra que o pacote com 28 comprimidos custa entre R$ 61 mil e R$ 85 mil. Em março do ano passado, a Anvisa rejeitou pedido de patente apresentado pela Gilead, o primeiro passo para que o mercado seja aberto aos genéricos.
— O preço é o calcanhar de Aquiles para atender uma estratégia de saúde pública — comentou Moreno. — No meu entendimento, encontrar mais usos para essa droga pode favorecer a queda dos preços. O aumento da demanda pode gerar maior produção e criar uma pressão pela redução dos valores cobrados. Isso pode beneficiar até mesmo os pacientes com hepatite C.
Em busca de outras alternativas farmacológicas para o tratamento da doença, Lucio Freitas-Junior, pesquisador do Instituto Butantan e pesquisador colaborador do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, realizou ampla análise para identificar compostos já em uso comercial para outras doenças que sejam capazes de combater a febre amarela. Das 1.280 drogas rastreadas, 88 conseguiram reduzir a infecção em 50% ou mais. Agora, a equipe do pesquisador trabalha na otimização desses fármacos e busca parceiros na indústria farmacêutica brasileira.
— A febre amarela é urgente. Com essa estratégia nós estamos encurtando o tempo para colocar um medicamento no mercado — disse o pesquisador. — Normalmente, o processo de pesquisa de novos medicamentos leva entre 7 e 8 anos até os testes clínicos, nós encurtamos para 3 ou 4 anos, ou até menos.
Como última alternativa para salvar a vida dos pacientes, o estado de São Paulo realizou transplantes de fígado em sete pessoas que desenvolveram hepatite fulminante em decorrência da febre amarela, sendo que três vieram a óbito. No Hospital das Clínicas da USP foram realizados cinco procedimentos, com uma morte. No Hospital de Clínicas da Unicamp foram duas cirurgias e os dois pacientes faleceram. Um terceiro aguarda por um órgão compatível.
Durante a semana, o secretário de Estado da Saúde de São Paulo, David Uip, tornou públicas as duas estratégias adotadas de forma emergencial para o tratamento da doença.
— Isso é inusitado, é a primeira vez que se faz no mundo — disse Uip, sobre os transplantes. — Talvez estejamos diante de uma possibilidade de curar a hepatite fulminante causada pelo vírus da febre amarela
O último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, que contabiliza os casos entre 1º de julho do ano passado e 30 de janeiro, aponta 81 mortes por febre amarela, com 213 casos confirmados e 435 em investigação. (G1).
Créditos: WSCOM