Em busca de apoio em meio à crise política, o presidente Michel Temer reuniu ontem 20 governadores e vice-governadores em um jantar no Palácio da Alvorada. O encontro foi intermediado pelo presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, que enviou ofício aos estados com a promessa de tratar da repactuação das dívidas dos governos regionais com a instituição. Essa renegociação havia sido aprovada pelo Congresso há seis meses, mas ainda não saiu do papel por falta de regulamentação. No total, os valores envolvidos somam R$ 50 bilhões. O governador da Paraíba, Ricardo Coutinho (PSB), rejeitou convite para o jantar.
Numa demonstração clara de mudança na condução do BNDES, Paulo Rabello, que substituiu Maria Silvia Bastos Marques no comando do banco, informou que pretende criar um núcleo destinado a destravar o processo de repactuação. Será dado um prazo até 31 de julho para que os governadores procurem o BNDES a fim de iniciar a renegociação das dívidas. O critério será a ordem de chegada.
— Nós temos um novo presidente do BNDES — disse Temer na abertura do jantar. — Há dívidas lá que são garantidas pela União, têm um determinado tratamento, e dívidas não garantidas pela União, que têm outro tratamento. O Paulo Rabello de Castro já fez um levantamento. Nós temos que encontrar um caminho que seja saudável para os estados e que também não seja prejudicial para o BNDES e para a União.
Integrantes do BNDES explicaram que, do total de R$ 50 bilhões, R$ 20 bilhões são dívidas dos estados que poderão ser alongadas por um prazo de 20 anos (com carência de quatro anos) assim que houver a regulamentação da lei complementar 156, que também alongou os débitos estaduais com a União. Ainda falta editar uma resolução do Senado, outra do Conselho Monetário Nacional e uma portaria do Tesouro Nacional.
Outros R$ 30 bilhões são empréstimos que só poderão ser negociados se houver aval do Tesouro. Esse valor é relativo a operações diversas, contratadas ou em curso, às quais a atual lei 156 não se aplica. Paulo Rabello se reuniu ontem de manhã com a equipe técnica do BNDES para elaborar a pré-proposta, que foi levada ao jantar no Alvorada.
A discussão em torno da regulamentação para alongar as dívidas dos estados com o banco estava marcada para ocorrer hoje na casa do presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE). No entanto, o Palácio do Planalto viu no tema uma oportunidade para se aproximar dos governadores em um momento de fragilidade política. Por isso, puxou o jantar para si e derrubou a reunião com Eunício. Antes do encontro no Alvorada, no entanto, interlocutores dos estados avaliavam que a margem de manobra do presidente não é grande:
— A repactuação é importante, mas ela tem efeitos limitados porque dá fôlego aos estados pequenos. Os grandes precisam de bilhões. Acho que Temer tem muito a pedir e pouco a oferecer — disse uma fonte ligada aos governadores.
Integrantes da equipe econômica garantiram que não haverá dinheiro novo do BNDES para os estados, apenas recursos já previstos e de acordo com o limite de endividamento de cada ente. Os ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira, e a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, foram convidados para o jantar, bem como outros auxiliares mais próximos a Temer, como Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência), Eliseu Padilha (Casa Civil) e Antonio Imbassahy (Secretaria de Governo), além dos presidentes do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal.
— O objetivo do jantar é discutir temas econômicos, como destravar os investimentos e gerar empregos. Isso passa por uma melhora no fluxo financeiro dos estados — disse Imbassahy.
Já Moreira Franco assegurou que as conversas com os governadores não comprometem o ajuste fiscal:
— O governo está fazendo um esforço, por meio da equipe econômica, para reanimar a economia e manter a saúde financeira dos estados e municípios, mas isso não significa nenhuma perda na manutenção do compromisso de manter um ambiente com absoluta austeridade fiscal, tanto da União quanto dos estados.
Segundo o governo federal, caso todos os R$ 20 bilhões em débitos já acertados sejam renegociados, haverá uma redução no serviço da dívida dos estados de R$ 6 bilhões nos próximos três anos. Serão R$ 2,3 bilhões este ano, R$ 2 bilhões em 2018 e R$ 1,7 bilhão em 2019.
O Rio de Janeiro, que tem saldo devedor de R$ 7,6 bilhões com o BNDES e passa por grave crise fiscal, seria um dos maiores beneficiados. A dívida total do estado, incluindo União, bancos públicos e outras instituições, é de R$ 110 bilhões. Como houve queda na arrecadação nos últimos anos, o governo tem atrasado salários dos servidores e deixado de honrar vários contratos de financiamento. Segundo a Secretaria estadual de Fazenda, só este ano, a União já bloqueou R$ 1,5 bilhão do Rio por atraso no pagamento das parcelas devidas à União ou de empréstimos nos quais o governo federal é avalista.
Alinhado com o governo, o presidente do BNDES tem ido regularmente a Brasília, onde se reúne com políticos. Na semana passada, ele jantou com um grupo de parlamentares da base aliada, para rediscutir o papel do banco com deputados e senadores. No encontro, contou uma fonte, Paulo Rabello disse que os empréstimos estavam paralisados porque os funcionários do banco estavam sendo tratados como suspeitos em operações irregulares e por isso, ninguém tinha coragem para assinar processos de liberação de recursos.
— Ele nos disse que não fará generalizações e que os casos serão pinçados e tratados individualmente — disse um parlamentar.
Outra pauta que os estados querem tratar com o governo federal é a securitização de créditos da dívida ativa — no total de R$ 60,5 bilhões, estes reforçariam os cofres estaduais. Mas integrantes da equipe econômica admitem que essa demanda será difícil de atender.
Embora já exista no Congresso um projeto de lei prevendo essa securitização, um parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) afirma que a venda de créditos tributários do governo a terceiros fere o Código Tributário Nacional (CTN). Técnicos do governo federal explicam que não seria possível repassar o direito de receber um imposto. Além disso, esses créditos teriam de ser vendidos com um desconto para serem atraentes aos compradores, o que poderia provocar perdas aos cofres públicos.
— Uma lei que está no Congresso não pode alterar o CTN. Vai ser difícil os estados conseguirem avançar nessa área — disse o técnico.
Ainda para agradar aos aliados, o governo conseguiu aprovar ontem na Câmara dos Deputados a tramitação de um projeto de lei que permite ao governo usar recursos de precatórios para fechar suas contas. Isso vai ajudar a equipe econômica a flexibilizar o contingenciamento de quase R$ 40 bilhões que visa a garantir o cumprimento da meta fiscal do ano e, assim, autorizar mais gastos para pastas comandadas por aliados. Quando o projeto passar pelo Senado, o governo espera conseguir um reforço de R$ 8,6 bilhões para os cofres públicos.
Créditos: WSCOM
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