A Procuradoria Geral da República (PGR) prepara-se para pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) a abertura de uma série de inquéritos e ações criminais contra políticos em decorrência da Operação Lava Jato. Na segunda-feira 2, durante evento de reabertura do Judiciário após 40 dias de folga, um parlamentar conversou com o procurador-geral, Rodrigo Janot, e ministros do STF. Ficou com a impressão de que os processos não pouparão partidos. Até os de oposição ao governo devem botar as barbas de molho. “O clima é de tensão no Congresso”, conta este parlamentar.
Até aqui, o Ministério Público Federal já apresentou 18 denúncias contra 86 pessoas por corrupção, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, crimes contra o sistema financeiro e tráfico de drogas. São casos a somar 2,1 bilhões de reais em recursos públicos desviados, dos quais 500 milhões já foram recuperados e 200 milhões, bloqueados. Nenhum dos acusados era parlamentar. Quando chegar a hora da verdade para a turma do foro privilegiado, não se devem esperar histórias do tipo “mensalão”. Janot já deu a entender que considera as fraudes na Petrobras como obra de um cartel de empreiteiras subornadoras de agentes públicos.
Apesar disso, é certo que o governo sairá chamuscado. As maracutaias podem até ter começado há mais de 15 anos, como acreditam os procuradores de Justiça mergulhados no caso, mas a maioria dos suspeitos na mira de Janot pertence à base do governo no Congresso. Por isso, o Palácio do Planalto finaliza um pacote anticorrupção para vir a público quase junto com as ações da PGR. Uma tentativa de mostrar a reprovação das falcatruas por Dilma e de proteger a imagem do governo.
O pacote tem cinco medidas, todas prometidas por Dilma na eleição e, mais recentemente, na primeira reunião ministerial do ano, realizada no fim de janeiro. Nos planos presidenciais, estão a criminalização do caixa 2 eleitoral e do enriquecimento ilícito de funcionários públicos, o confisco dos bens oriundos daquele enriquecimento, a aceleração de julgamentos de processos contra políticos no STF e a criação de juizados especiais para crimes de improbidade administrativa.
“Todas essas medidas têm o propósito de garantir processos e julgamentos mais rápidos e punições mais duras, o que representará um forte golpe na impunidade”, diz o documento recém despachado pela Presidência ao Congresso, como ocorre todo início de ano. “Mesmo assegurando o amplo direito de defesa dos acusados e o contraditório, princípios básicos de justiça, queremos eliminar os procedimentos que permitem que processos e julgamentos se arrastem, indefinidamente, em nosso País.”
Nem todas as propostas serão enviadas pelo Planalto ao Congresso. É possível, segundo apurou CartaCapital, que o governo encampe projetos já existentes no Legislativo. A mudança no rito do STF depende, por sua vez, de uma iniciativa que só pode partir da própria corte. O envolvimento direto dos três poderes no pacote servirá para materializar a ideia de Dilma de um “pacto nacional” contra a corrupção.
A criminalização do caixa 2 eleitoral tende a ter como base uma lei proposta em 2013 pelo vice-presidente do Senado, Jorge Vianna, do PT do Acre. Pelo texto, o crime estaria em captar, usar ou movimentar dinheiro de campanha sem declarar à Justiça eleitoral. Praticá-lo daria de 5 a 10 anos de cadeia. Na legislação atual, caixa 2 até pode resultar em prisão, por falsidade ideológica. O mais comum, porém, é gerar processos por perda de mandato, e mesmo assim é difícil abri-los, pois só se pode fazê-lo até 15 dias depois da eleição.
A punição de cadeia para servidor enriquecido ilicitamente já foi proposta há uma década pelo próprio governo. Seriam de três a oito anos de detenção para quem não conseguir provar ter uma renda honesta capaz de justificar a alta do patrimônio. A lei chegou à Câmara dos Deputados em julho de 2005, logo no início da crise do “mensalão” do PT. Não saiu do lugar. Jamais houve sequer um relator designado para examiná-la. É este texto que tende a encampado pelo governo agora.
Hoje, enriquecimento ilícito é castigado só com sanções de natureza civil: perda do cargo público e dos bens, ressarcimento aos erário, suspensão dos direitos políticos por até 10 anos, multas e proibição de assinar contratos com o Estado. O Brasil é signatário de dois tratados internacionais de combate à corrupção que recomendam prender servidor que fica rico de modo ilegal, mas nunca tomou as providências para cumpri-los. Um é uma convenção interamericana de 1996. O outro, no âmbito das Nações Unidas, de 2003.
Além da prisão para quem enriquecer ilegalmente, o governo defende confiscar os bens adquiridos assim. A linha geral da ideia consta de projeto apresentado em 2013 pelo então deputado Vieira da Cunha, do PDT do Rio Grande do Sul. O texto cria uma ação civil pública de tomada dos bens. Já existe este tipo de confisco atualmente, mas só em ações penais. Se a lei mudar, será possível tentar confiscar mesmo em casos em que o autor presumível do ilícito tenha morrido, fugido ou não possa ser identificado. É outra determinação de acordos internacionais assinados pelo Brasil, como o da ONU de 2003, jamais levada adiante.
Como Vieira da Cunha não se reelegeu no ano passado, o projeto foi automaticamente arquivado na Câmara. É possível que o governo apresente um novo, de teor parecido. Mesma situação por trás da ideia de constituir varas especializadas para causas de improbidade administrativa.
Em julho de 2006, como resultado de suas investigações do “mensalão” do PT, a CPI dos Correios propôs constituir aquele tipo de juizado. Seriam varas em Tribunais Regionais Federais com foco em crimes contra o Estado e o sistema financeiro, lavagem de dinheiro, ocultação de bens, além de improbidade. Uma forma de agilizar os julgamentos. A proposta adormeceu no Senado a partir de 2009. No fim de 2014, foi arquivada em definitivo. Deve renascer pelas mãos do governo.
A agilização dos processos no STF contra os políticos detentores de foro privilegiado só pode ser proposta pelo próprio Supremo. É uma ideia de seu atual presidente, Ricardo Lewandowski. O governo já negocia com ele para a iniciativa integrar o pacto anticorrupção que vem aí.
Responsável principal pelas negociações do Planalto com o Congresso, o ministro Pepe Vargas, da Secretaria de Relações Institucionais, acredita que o pacote pode ser aprovado inclusive com o apoio dos partidos adversários do governo. Para ele, são medidas de interesse geral e sem coloração partidária.
Créditos: Carta Capital
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