Seja por água, terra ou ar, a chegada à capital do Amazonas é uma experiência ao melhor estilo Babel dentro do próprio país, onde o português vai se fundindo a outras línguas. A tradição indígena salta aos olhos e aos ouvidos, como em nenhum outro canto do país. Das placas com nomes dos lugares aos cardápios, com seus tambaquis, tapioca e açaí. O mesmo vale para as pessoas que levam no rosto a nítida descendência dos povos da floresta.
Por essa razão os estrangeiros facilmente destoam. E não são poucos. É supercomum intercalar conversas em diferentes línguas ao cruzar pelas ruas com claríssimos alemães, ingleses, franceses, canadenses ou norte-americanos com seus respectivos mochilões sobre os ombros e mapas debaixo do braço. Todos conduzidos pelo sonho de conhecer a maior floresta do mundo, com seus mistérios, sua gente, sua biodiversidade. É o que faz de Manaus um dos principais destinos do turismo internacional no Brasil.
E não apenas os estrangeiros de longe compõem esse mosaico de línguas, traços e culturas. Os sons latinos e do brega se misturam. Vale se deixar perder pelas ruas do centro comercial num dia de semana para ver que o Caribe brasileiro está bem aqui. Além do clima equatorial, o portunhol é mais um elo entre os vizinhos. A cada ano Manaus recebe mais venezuelanos, peruanos e bolivianos – atraídos principalmente pelas oportunidades de trabalho –, que logo se sentem em casa.
Isso sem levar em conta o grande número de imigrantes orientais que se instalou na cidade desde a década de 1960 por causa de incentivos à produção de eletrônicos na Zona Franca de Manaus. A comunidade japonesa é uma das maiores no Brasil e, claro, o que não falta são bons restaurantes que unem a tradicional cozinha à maior variedade de peixes existente no mundo.
Família em embarcação no Furo do Paracuúba, próximo ao encontro dos
rios Negro e Solimões(Foto: João Marcos Rosa/Nitro)
rios Negro e Solimões(Foto: João Marcos Rosa/Nitro)
Cores e quitutes
A porta de entrada para a floresta reserva outras saborosas surpresas, curiosidades culturais e uma bela arquitetura dos tempos áureos da borracha. No centro histórico, a influência europeia estampa prédios importantes, como a Alfândega do Porto, construída em 1906 em estilo inglês, e o Mercado Adolpho Lisboa, construído de frente para o Rio Negro em 1882, com inspiração no Les Halles, de Paris.
O Teatro Amazonas merece uma visita de algumas boas horas. Especialmente no mês de abril, vale se programar (com antecedência) para conferir o Festival Amazonas de Ópera, que leva montagens locais, nacionais e internacionais para os palcos da imponente construção. Mas, em qualquer época, é possível viajar no tempo por meio de visitas guiadas pelo prédio inaugurado em 1896. É impressionante o cuidado com a preservação dos afrescos, lustres, cabines, salões e mobiliário, que ainda guardam o luxo e a ousadia do que representou a casa de ópera erguida em plena selva amazônica e patrocinada pela seiva das seringueiras, que também já fez jorrar muito dinheiro na região.
Nos fins de semana, o entardecer nos arredores do teatro ganha um colorido especial. Os sons invadem a praça e nos convidam a ficar um pouco mais. Da tradição da ópera vem o gosto pela boa música de concerto, e logo algumas centenas de cadeiras se juntam às dos bares e sorveterias, formando uma só plateia para o espetáculo, que fica ainda melhor se acompanhado dos quitutes amazônicos.
Eis um universo a ser explorado. Não se trata apenas de força de expressão ou de modismos gastronômicos. Tão rica é a diversidade de peixes, frutos, cores e aromas, suas combinações e possibilidades, que a rotina merece ser deixada de lado. Uma boa pedida para começar o dia são os cafés regionais, regados a sucos de cupuaçu, jenipapo e graviola, além do já famoso sanduíche “x-caboclinho”, feito com pão francês e tucumã. No almoço ou no jantar, não deixe de provar a costela de tambaqui – peixe da bacia amazônica que pode pesar mais de 40 quilos e protagoniza desde pratos simples da culinária regional até invenções recentes de chefs renomados. Como sobremesa ou a qualquer hora do dia para espantar o calor, os sorvetes locais são uma verdadeira coleção de sensações a experimentar.
E, convenhamos, quem vai a Manaus busca muito mais. E encontra. Afastando-se do centro urbano, muitas são as opções de hotéis de selva, com atrações naturais e programação que variam amplamente tanto no preço como na autenticidade de alguns desses “encontros com a natureza”, nem tão selvagem como se promete, mas uma boa oportunidade de contato com esse mundo novo.
Vitória-régia: planta aquática típica da região amazônica (Foto: João Marcos Rosa/Nitro)
Mesmo se hospedando em hotéis dentro da cidade, o visitante poderá em alguns minutos conhecer um pouco do ecossistema amazônico em parques públicos e reservas, como o Parque do Mindu, a Estação Ecológica Samaúma e o Jardim Botânico Adolpho Ducke, com seus cerca de três quilômetros de trilhas na intimidade da floresta. E, se tiver de escolher apenas uma atração em Manaus, ela se chama Rio Amazonas. Esqueça tudo e contrate no porto um passeio de barco rumo ao Encontro das Águas. Do cais, a imensidão do Rio Negro já impressiona e o percurso ainda revela muitas ilhas e intervalos para fotografar jiboias e preguiças trazidas por pescadores.
Nada se compara, porém, ao encontro das águas do Negro com o Solimões. Ainda que você tenha lido e decorado todas as explicações físicas e químicas para o fenômeno das águas que não se misturam por quilômetros, não há como não se surpreender. É fascinante, intrigante e muito maior do que a vista pode alcançar. Dentro de um pequeno barco é que finalmente se aprende a repetida lição de geografia que afirma que este é o maior rio existente no planeta.
E, como tudo na Amazônia é superlativo e impactante, não deixe de conhecer outros recordes com que a natureza presenteou o Brasil. Antes de voltar ao cais, percorra de barco alguns igarapés que escondem verdadeiros jardins de vitórias-régias, as maiores plantas aquáticas de que se tem notícia. Outro passeio inesquecível é sobrevoar as Anavilhanas, conjunto de ilhas que formam um dos maiores arquipélagos fluviais do mundo. Com suas mais de 400 ilhas e rica biodiversidade, o local é um parque nacional com visitação permitida apenas para pesquisadores – mas, avistado do alto, o espetáculo é de todos.
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